quarta-feira, 15 de abril de 2015

UNA - Blogueiro sofre ação de indenização por danos morais

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

COMARCA DE UNA

 Processo: 8000009-58.2015.8.05.0267 

DECISÃO



I - Relatório 

Trata-se de ação de indenização por danos morais cumulada com obrigação de fazer e não fazer, com pedido de antecipação de tutela, movida por Diane Brito Ruscionlelli em desfavor de Adriano Ruscionlelli da Silva sob alegação de que o Réu teria publicado em um "blog" palavras ofensivas à honra da Autora. Afirma a inicial que as expressões utilizadas, como "ditadora", "diabólica", "satânica", "mentirosa" dentre outras afrontam a dignidade da Autora. A Autora requer na inicial a concessão de antecipação de tutela para determinar que o Réu se abstenha de ofender a honra da Ré, bem como seja compelido retirar de seu "blog" as expressões ofensivas. Documentos juntados comprovando a existência das mencionadas expressões contidas em "facebook" e "blog". É o breve relato.  

II - FUNDAMENTOS 

A Constituição Federal da República, promulgada em 1988, é fruto de uma vitória da população brasileira que sofreu durante anos com Ditadura Militar, tempos de opressão com mitigação de direitos fundamentais. 

O artigo 5º, IV, da Carta Magna consignou expressamente a livre manifestação de pensamento como direito fundamental de todos e no mesmo sentido o fez o artigo 220 ao tratar dos meios de comunicação, exatamente para coibir as vedações anteriormente existentes em virtude da Ditadura Militar. 

Conforme dito, a livre manifestação do pensamento é direito fundamental, contudo nenhum direito fundamental é absoluto e deve ser analisado em harmonia com demais direitos fundamentais, não havendo soberania entre os mencionados direitos. 

O Estado Democrático de Direito não pode ser confundido com Anarquismo no qual inexistem normas e regras básicas a serem seguidas pelas pessoas, sendo que a Constituição Federal garante direitos os quais devem ser gozados até o limite de um direito alheio, popularmente conhecida a máxima como "seu direito termina quando começa o meu".

As normas estabelecidas no direito certamente são reflexos de parâmetros educacionais já traçados há anos pela sociedade, pois muito antes da existência de doutrinas constitucionais versando sobre harmonização de direitos fundamentais ou sobre o abuso de direito, certamente já existia na sociedade como "regra moral" a exigência de observância da máxima acima mencionada. 

Importante anotar que o abuso de direito foi inicialmente reconhecido, no âmbito jurídico, na França no emblemático caso dos dirigíveis, no qual um proprietário de um imóvel construiu em sua propriedade estacas que tinham o único propósito: furar balões de dirigíveis de seu vizinho que passavam por cima de sua propriedade. Configurado o abuso de direito.

Toda a divagação é importante para verificar se o Réu, no caso concreto, estaria agindo com abuso de direito ou simplesmente estaria exercendo o direito constitucional da livre manifestação do pensamento. 

Num juízo cognocível ou inicial, verifico pelos documentos juntados pela Autora que realmente o Réu se utilizou de infelizes colocações e expressões, que fogem (E MUITO) o direito fundamental de livre manifestação do pensamento. 

No caso concreto, tem-se o conflito do mencionado direito fundamental que garante a expressão livre com a dignidade da pessoa humana e sua honra, que não pode ser violada, sob pena de direito de resposta, além da indenização por dano material, moral ou à imagem (art. 5º, V, CF). 

A técnica denominada de efeito transacional sinalagmático permite exatamente a aferição, em cada caso concreto, de quando um direito fundamental se sobrepõe a outro em conflito, análise feita sob o crivo do princípio da razoabilidade. 

A Autora é Chefe do Poder Executivo Municipal e merece ser tratada com respeito, não apenas por exercer o mencionado mandato eletivo, mas porque é um ser um humano, cidadã que também tem direitos e garantias fundamentais resguardados pela Constituição Federal. 

Ao verificar o mencionado sítio "atitudeemuna" noto que o Réu é pessoa maior e capaz para o exercício dos atos da vida civil, inclusive sendo recentemente escolhido como presidente de associação de estudantes deste Município, universitário e que deveria exercer seus direitos dentro dos limites legais, sem cometimento de abuso.

Analisando as provas acostadas pela Autora, impossível não comparar a presente situação com um processo recentemente apreciado no âmbito do Juizado Especial Criminal, neste Município, no qual ADOLESCENTES incidiram exatamente na mesma atitude do Réu em site de relacionamento, prática ilícita que merece ser rechaçada pelo Direito (Processo 0001352-65.2014). 

Noutro sentido, importante ressaltar que todo aquele que é formador de opinião, como no caso o Réu que possui "blog" acessado pela sociedade de Una, deve agir em conformidade com a lei e regras básicas de convívio em sociedade com educação, respeitando a honra e imagem de terceiros, com responsabilidade. 

A imprensa, conforme pacífica jurisprudência dos Tribunais Superiores, não está livre e imune por suas publicações, devendo responder por eventual excesso ou abuso de direito. Mister salientar que o constituinte originário garantiu a quem efetivamente de direito a imunidade por palavras, não sendo o caso do Réu.

Percebo violação ao artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal e artigo 187 do Código Civil, presente, portanto, o primeiro pressuposto para deferimento de antecipação de tutela, qual seja, a fumaça do bom direito.


Noutro sentido, também há um perigo na demora porque a modernização permite que a cada minuto um número indefinido de pessoas tenham acesso a informações que ofendem a honra e imagem da Autora, motivo pelo qual também verifico existir o segundo requisito consistente em perigo na demora. Diante do exposto, DEFIRO A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA para determinar que o Réu exclua de sua página de relacionamentos (facebook) as já mencionadas expressões indevidas e ofensivas à honra da Autora, no prazo de 48 (quarenta e oito horas), bem como se abstenha de novamente inserir tais expressões, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais). Com base no poder geral de cautela previsto no artigo 798 do Código de Processo Civil, bem como artigo 5º, V, da Constituição Federal, determino a publicação de íntegra desta decisão no mesmo "blog" no qual foram veiculadas as expressões ofensivas, que deverá ser feita no prazo de 24 horas após a intimação, sob pena de aplicação de multa no mesmo valor. Não há razão legal para o trâmite com segredo de justiça. Intimem-se. 

Una - BA, 09 de abril de 2015. 

Maurício Alvares Barra Juiz Substituto]

fonte: click aqui

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